Consentimento continuado
O avanço da civilização humana no último século, principalmente em relação à dignidade da pessoa, impôs a todos novo modelo de convivência social, tanto nas relações diretas quanto nas inter-relações. Na relação médico-paciente não foi diferente, e nem poderia, sendo a medicina profissão de alto caráter humanístico. No plano prático, um dos reflexos mais acentuados foi a imposição da participação efetiva do paciente nas decisões terapêuticas a que deva ser submetido.
O princípio da autonomia (ou da liberdade) determina que o paciente deva ser o protagonista de seu destino, devendo o médico informá-lo e conscientizá-lo das possibilidades do tratamento, dos seus riscos e possíveis benefícios, a ponto de torná-lo capaz de decidir livremente o que lhe convier. Logicamente que esta ordem não vale em casos de risco iminente de vida, quando, então, cabe ao médico, excepcionalmente, tomar as rédeas da situação e realizar o procedimento que a urgência exigir, sem necessidade de ouvir o paciente ou seu representante legal. No entanto, há casos que o primeiro consentimento dado pelo paciente (consentimento primário) não abre as portas para qualquer procedimento ser realizado sem que seja ele novamente consultado.
O consentimento de internação, por exemplo, não é um salvo conduto para o médico realizar qualquer terapia durante sua permanência nosocomial. Até porque cada procedimento tem seu grau de risco e possibilidades de sucesso, além dos anseios, perspectivas e expectativas pessoais de cada indivíduo, idiossincrasia que justifica nova consulta à vontade do doente ou seu representante legal sempre que houver mudanças significativas nas condutas terapêuticas.
Esses consentimentos continuados (ou secundários) tornam-se necessários, mormente em casos cuja gravidade da nosologia exige tratamentos longos e penosos, envolvendo equipes multidisciplinares, de várias especialidades médicas, e revela-se de grande importância nos dias atuais, onde os conflitos entre médicos e pacientes tendem a agudizar-se. É o preço da modernidade.
O autor é advogado atuante no ramo do Direito Médico.
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