Rondônia, 21 de novembro de 2024
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Limites do uso da “máquina pública” na campanha eleitoral

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Edirlei Souza

A ocupação de cargos públicos eletivos de comando dos poderes legislativo e executivo está submetida a uma votação popular. Isso decorre da forma de governo instituída no Brasil, qual seja, república (do latim res publica – coisa pública), e é por isso que o art. 1º da nossa Constituição Federal enuncia que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”.

Duas caraterísticas marcantes de uma república é a “eletividade” e a “temporariedade” dos mandatos eletivos. E é nesse contexto que a Constituição Federal prevê expressamente no §3º do art. 14 os requisitos necessários que qualquer cidadão deve preencher para concorrer a um cargo eletivo (ser alfabetizado; ter nacionalidade brasileira; estar no pleno exercício dos direitos políticos; possuir alistamento eleitoral; possuir domicílio eleitoral na circunscrição do pleito; ter filiação partidária e idade mínima conforme o cargo em disputa).

Pois bem. Preenchidas essas condições, a missão seguinte é conquistar a “simpatia” do eleitor durante o período legal permitido pela legislação (a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição).

A disputa igualitária constitui-se num dos pilares de uma campanha eleitoral. Na prática, devem estar disponíveis a todos os candidatos os mesmos meios para conquistar o voto do eleitor, ao que chamamos de princípio da paridade de armas.

E é por isso que o art. 73 da Lei n. 9.504/1997 (Lei das Eleições) dispõe sobre um rol de condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais, entre as quais está a proibição de “ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios (inciso I).

Como visto, a regra é o afastamento do uso da máquina pública nas eleições, como forma de garantir a igualdade de oportunidades, pois, como é sabido, nem todos os que estão disputando um cargo eletivo têm acesso à estrutura do poder público (pessoal, serviços e equipamentos).

Entretanto, aqui cabe registrar que essa regra não é absoluta. O legislador federal excepcionou o rigor normativo em três situações:

a) uso de prédios públicos para reunião oficial do partido para escolha de candidatos/coligações -  convenção partidária (parte final do inciso I do art. 73 da Lei das Eleições); 

b) uso de transporte público oficial pelo Presidente da República e sua comitiva, cujo gasto deve ser ressarcido pelo partido/coligação (§2º do art. 73 da Lei das Eleições); e

c) uso da residência oficial do Presidente e Vice-Presidente da República, Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, Prefeito e Vice-Prefeito para encontros/reuniões destinados à campanha, desde que não tenham caráter de ato público (§2º do art. 73 da Lei das Eleições).

Como visto, o legislador optou apenas por três situações que permitem o uso da máquina pública, sendo que somente o gasto com transporte do Presidente da República e sua comitiva estão sujeitos ao ressarcimento dos cofres públicos (Art. 76 da Lei das Eleições).

Nesse ponto, o reembolso deve ocorrer nos 10 (dez) dias úteis seguintes ao dia da eleição e terá por base o tipo de transporte usado e a respectiva tarifa de mercado cobrada no trecho correspondente, ressalvado o uso do avião presidencial, cujo ressarcimento corresponderá ao aluguel de uma aeronave de propulsão a jato do tipo táxi aéreo. Caso não haja a devolução dos gastos, será aplicada pena de multa correspondente ao dobro das despesas.

Já sobre o uso da residência oficial dos governantes, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) fixou três exigências cumulativas: a) somente poderá realizar contatos, encontros e reuniões, ou seja, praticar atos em que se dirige a interlocutores diretos; b) as tratativas devem ser pertinentes à sua própria campanha; e c) vedado por completo que tais contatos, encontros e reuniões assumam ‘caráter de ato público’, ou seja,  o evento deve ser destinado a traçar arranjos internos voltados para a campanha (Ac. de 27.9.2022 no Ref-AIJE nº 060121232, rel. Min. Benedito Gonçalves).

Nesse mesmo julgado, o TSE condenou a conduta de um candidato titular do Poder Executivo, que abriu uma “live” eleitoral, usando a estrutura do imóvel residencial custeado pelo poder público, que alcançou mais de 300 mil eleitores e eleitoras.

Nesse contexto, o uso de bens e serviços públicos na campanha do candidato à reeleição, que estejam inacessíveis a qualquer dos demais competidores, caracteriza conduta tendente a ferir a isonomia do pleito.

Por fim, cabe ressaltar que deve ser analisado cada caso concreto, de forma a não inviabilizar o desempenho do mandato eletivo durante o período de campanha eleitoral. Digo isso porque não é exigido dos atuais mandatários no legislativo e executivo o afastamento dos respectivos cargos eletivos para participarem do pleito eleitoral, com exceção do titular do Poder Executivo que concorre a outro cargo eletivo (§6º do art. 14 da Constituição Federal).

Por óbvio, penso que não constitui uma conduta vedada o uso pontual, por um parlamentar, do veículo oficial para deslocamento a uma emissora de televisão para uma única entrevista, em dia útil e no horário do expediente comercial, para a qual foi convidado com o fim de explanar acerca de um projeto de lei de sua relatoria aprovado na Casa de Leis. 

Em todo caso, sempre deverá ser levado a efeito a gravidade da conduta, sobretudo em relação à intensidade, repercussão social e influência direta no equilíbrio do combate eleitoral.

Uma vez caracterizado o uso da máquina pública fora das exceções permissivas citadas, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma e pagamento de multa no valor R$ 5.320,50 a R$ 106.410,00, bem com responderá por ato de improbidade administrativa (§§ 4º ao 7º do art. 73 da Lei das Eleições).

O instrumento processual contra a prática de conduta vedada é a representação, que deve ser ajuizada até a data da diplomação (§12 do art. 73 da Lei n. 9.504/1997).

Edirlei Souza é rondoniense, professor, graduado em Direito, pós-graduado em Direito Eleitoral e Processo Eleitoral e em Comunicação Pública e servidor público federal.

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