O sistema de integração que alimenta o homem e salva a humanidade
Rondônia tem extensão territorial de 23 milhões de hectares, nove milhões estão ocupados pela agropecuária e desse total, a metade, 4,5 milhões já são áreas degradadas. Esse número alarmante é o resultado de décadas de prática da monocultura – produção de um único produto agrícola - manejo inadequado e falta de reposição dos nutrientes do solo. Para iniciar um sistema de produção, o agropecuarista desmatava a floresta e mantinha a mesma cultura por anos sem se preocupar com o enfraquecimento da terra ao longo das safras. Ao vivenciar a queda brusca na produtividade, abandonava a área degradada e partia para um novo desmatamento. O mundo passou a ver com preocupação esse círculo vicioso.
Com a pressão mundial pela redução de gases de efeito estufa (queimadas lançam gases e derrubadas reduzem a eliminação do CO2) e as estimativas de aumento da demanda por alimento em 70% até o ano 2050, estudiosos buscaram técnicas de plantio para conciliar produção e meio-ambiente e, ainda, aumentar significativamente a produtividade. Foi quando surgiu, há 30 anos no Brasil, a primeira propriedade com o sistema Integração, Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF). A difusão do método foi acompanhada pelo programa de “Boas Práticas Agropecuárias” (BPA) da Embrapa. Cerca de 94 propriedades rurais do Brasil que já aderiram o sistema cumprem a função de social. O ILPF foi apresentado como modelo de sustentabilidade na Conferência do Clima (COP 21) em Paris.
O sistema ILPF torna a produção agropecuária compatível com o trinômio econômico-social-ambiental. O princípio básico é a recuperação de solos degradados para reutilização da área. A propriedade é dividida em módulos para o cultivo rotacionado e consorciado de pasto e grãos. “É a tecnologia do futuro, a agricultura do futuro que a gente, quando fala de ILPF, tá falando dela. Hoje, no momento em que mundo apresenta essa demanda exorbitante por alimento, temos que produzir sem agredir o meio-ambiente. Não podemos, não devemos e não precisamos mais desmatar”, diz Frederico Botelho, chefe de transferência de tecnologia da Embrapa em Rondônia.
Em meio a Amazônia Legal, Rondônia pavimenta essa via que se apresenta como única salvação do planeta. A 324 km da capital Porto Velho, no município de Machadinho do Oeste, a premiada fazenda Don Aro é excelência em sustentabilidade. É a primeira de Rondônia, segunda do Norte e décima propriedade rural do Brasil a receber o Certificado Ouro da Embrapa de BPA - Boas Práticas Agropecuárias. O dono da fazenda, Giocondo Vale, foi pecuarista durante 23 anos. Começou a formar o sistema de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta em 2013 quando percebeu que muito boi, no mesmo pasto por muito tempo era uma prática incompatível com fatores econômico, social e ambiental.
O solo degradado na Don Aro reduziu drasticamente a produtividade. O pasto não gerava matéria verde suficiente para manter um único boi por hectare. “Há três anos, nessa área estupidamente degradada, não tinha meia vaca acompanhada por hectare, uma produção que não pagava os custos na verdade”, diz o agropecuarista.
Há dois anos, boa parte do pasto da propriedade deu lugar à lavoura de arroz. O cultivo do grão devolveu os nutrientes da terra e fez a nova forrageira crescer em quantidade e qualidade. Aliando a recuperação do solo às técnicas de melhoramento genético do rebanho, sistema rotacionado de pastejo e abertura de curvas de nível em área de declive para evitar erosão, o agropecuarista teve um salto em produtividade de 200%.
As boas práticas na pecuária ajudam na preservação do meio-ambiente porque reduzem o ciclo de produção do gado de corte. Com o crescimento acelerado pela boa alimentação, o boi vai mais cedo para o abate e isso significa menos metano na atmosfera. O gás emitido pela flatulência e arroto dos animais é 25 vezes mais potente que o CO2.
Este ano, o produtor Giocondo Vale não vai ter safra de grãos. Ele quer nutrir a terra ainda mais e garantir que os colaboradores (como chama os funcionários da fazenda) não sejam levados à exaustão. Em alguns módulos onde colheu arroz, ele prepara a terra para plantar a “Crotalária-ochroleuca”, uma leguminosa agressiva, rústica, com raízes capazes de romper as camadas adensadas do solo e que apresenta boa produção de biomassa e fixação de nitrogênio. Um pequeno sacrifício financeiro para recuperação da capacidade produtiva do solo e render grandes frutos em médio prazo.
“Quando o produtor for plantar a soja nessa área não vai mais precisar gastar com calagem (correção com calcário). Vai fazer o plantio direto, economizando com mão-obra e maquinário e, consequentemente, ajudando o meio-ambiente ao não realizar a queima de óleo diesel”, explica o gestor ambiental Eanes Freire, que acompanha o trabalha de certificação na fazenda Don Aro.
Para 2016, o projeto na propriedade de ouro da Embrapa que acaba de completar o segundo clica de formação, é fazer um ensaio do milho como safrinha consorciado com a braquiária ruziziensis. “Colhe-se o milho e fez o acabamento do boi no cocho usando a técnica dos grãos inteiros. Tirando o milho, a braquiária sobe porque tem um remanescente de umidade. Você aproveita esse pasto para alimentar vacas que estão amamentando”, diz Giocondo Vale.
O sistema de integração na fazenda Don Aro estará completo em quatro anos. Em 2020, a propriedade de 1,7 mil hectares terá 500 hectares de agricultura e 450 hectares de pecuária. O restante é composto de florestas nativas, reflorestamentos e Áreas de Proteção Permanente (APPs).
Recuperando a floresta
Embora não esteja consorciada, a floresta está integrada à lavoura e a pecuária na fazenda Don Aro. As árvores cercam os módulos de produção nos quatro cantos da propriedade. O produtor fez reposição florestal em quase 60 hectares com essências nativas e exóticas, entre elas teca, ipê, eucalipto e castanheira. Há 11 pés de castanhas na propriedade, a maior floresta da espécie no Brasil.
A Don Aro também é exemplo na recuperação de preservação de APPs. Algumas foram cercadas com arames lisos e estacas, outras estão rodeadas por paus e tocos recolhidos dos pastos em processo de recuperação. O material usado para preservar as nascentes dos rios vai se decompor com o tempo e gerar mais matéria orgânica ao solo.
“É claro que tem um custo cercar uma APP, mas é um custo que se dilui muito rapidamente. Você tem a questão da reserva hídrica com garantia bem maior, a fauna e a flora que são melhoradas “ene” vezes como os corredores ecológicos e nascentes protegidas. E mais um detalhe importante: o manejo fica muito mais fácil com menos mão-de-obra, menos estresse. A vacada com bezerrada não vai pra dentro de rio, cruzar APP. Ela vai chegar na cerca, vai parar e você vai fazer o que deve ser feito”, explica Giocondo Vale.
Valorizando a gente do campo
Integrar lavoura, pecuária e floresta, mantendo harmonia entre produção e meio ambiente, não basta para uma certificação de ouro da Embrapa. É preciso também as boas práticas com ser humano que ajuda na implantação desse revolucionário sistema. Na fazenda Don Aro, todos os colaboradores têm carteira assinada, plano de saúde, acesso a uma boa educação para ele e toda família e moradia digna na propriedade rural. Trabalham uniformizados e com equipamentos de segurança.
Para incentivar ainda mais a boa produtividade de cada um dos trabalhadores, a Don Aro instituiu o 14º salário do ano e participação nos lucros das safras.
Produzir alimentos, respeitando o meio-ambiente, recuperando a saúde da terra, valorizando o ser humano é o futuro em muitos estados brasileiros. Em Rondônia, já é uma realidade.
(assista reportagem em vídeo da fazenda Don Aro no site Rondoniagora.com http://www.rondoniagora.com/noticias/rondonia+exemplo+na+agropecuaria+sustentavel+2015-12-01.htm)
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