Rondônia que eu quero em 2019
A Administração Pública existe como organização destinada a promover ações de bem-estar para o povo. Os representantes dos poderes e demais servidores públicos existem para servir à coletividade, pois toda a máquina pública é concebida com esta finalidade.
Estamos vivenciando um momento de revolução social, um clamor por mudança de gestão com respostas rápidas que impactem de forma direta no dia a dia do cidadão contribuinte. A esperança é de ver um trabalhador assalariado, que se encontre com seu filho com febre de 40 graus, ser atendido numa unidade hospitalar por uma equipe médica (servidores públicos) com rapidez e cordialidade; ou de ver o filho dele ser educado em escola pública com conforto e qualidade. Isso se resume em dignidade. Afinal, ele pagou, antecipadamente, por esse serviço com impostos.
O discurso público de falta de recursos é histórico e já não “cola” mais. O problema é de gestão.
Um grande exemplo é no Estado de Rondônia, onde este subscritor nasceu, vive até hoje e pretende ficar com sua família até o chamado divino. Aqui, o Estado vai ter em 2019 uma arrecadação estimada em mais de R$ 8 bilhões.
De pronto, já vem a pergunta: e o que será feito com tudo isso? Pois bem. A resposta é simples, há limites mínimos para investimentos nas áreas de maior impacto, que são saúde e educação.
Ocorre que, em muitos casos, esse mínimo é aplicado somente no aspecto formal. Contudo, o resultado esperado pelo povo, que é a excelência no atendimento nos hospitais, escolas e delegacias não é visto.
Aí vem outro questionamento: porque não é aplicado esse tal mínimo em bons serviços? A resposta é simples: falta gestão, ou seja, é preciso monitorar o dinheiro desde a saída do cofre até a sua aplicação final com saúde, educação e segurança de qualidades. Porém, o que acontece é que no meio do caminho existem muitos “oportunistas”, que vão beliscando os recursos e, ao final, chega, por exemplo, somente o aparelho de raio-x sem o operador, o quadro sem o professor ou o policial militar com colete vencido. É a cultura do "vamos meter a mão enquanto estamos no poder" ou de que "tem que ter o agrado para o processo andar". É o que se acostumou chamar de “ralo da corrupção”.
Tem outro ponto importante que também reflete a falta de uma gestão eficiente: a folha de pagamento inchada. É a cultura do “cabide de emprego”.
Quem nunca ouviu um amigo falar: “vou trabalhar na campanha desse político porque, se eleito, ele me prometeu um CDS (cargo em comissão) ”.
Nestas terras de Rondon, temos um total aproximado de 46 mil servidores públicos na folha de pagamento, que consomem, por mês, mais de 217 milhões de reais.
Sei que você, leitor, deve estar assustado com tudo isso, o que lhe faz perguntar: onde estão todos esses servidores? Nesta relação, há efetivos, comissionados, aposentados e até 9 ex-governadores. Pelo simples fato de terem assumido, ao menos um dia, de forma efetiva, o cargo de governador, passaram a ter direito de ganhar até a morte a singela recompensa de mais de R$ 25 mil por mês. Ainda bem que isso cessou a partir de 2015. Pode até ser legal, mas não é moral.
Na ativa, além dos concursados que, por mérito, entraram na Administração Pública, estão os famosos comissionados. Só no poder executivo há mais de 5,4 mil funções gratificadas e cargos em comissão para todo gosto, que vão de R$ 450 a R$ 25 mil, sem contar o auxílio saúde, o auxílio transporte e outras vantagens indiretas como diárias, passagens, etc. Tudo amparado por lei aprovada pelos nossos deputados estatuais (Lei Complementar n. 965/2017). Mais uma vez vem o questionamento: apesar da legalidade, isso é moralmente aceitável?
Quem já não se deparou com algum amigo que você pergunta onde ele está trabalhando e ele diz: “estou no governo! ” Pois é. Aí vem uma outra pergunta: isso quer dizer que todas essas gratificações estão disponíveis para o governador dar para quem ele quiser? Isso mesmo, é de livre designação/nomeação do titular do poder executivo. E existe critério objetivo para escolha dos contemplados? Formalmente não, em que pese o STF já ter afirmado que” "por ofensa à moralidade administrativa, é inválida a nomeação para cargo público quando o nomeado não exibe um mínimo de pertinência entre suas qualidades intelectuais e o ofício a ser desempenhado” (RE 167.137 STF).
Não é diferente na Assembleia Legislativa de Rondônia, que possui mais de 1880 cargos/funções comissionadas, com retribuição pecuniária que variam de R$ 680 a R$ 22 mil, sem contar os penduricalhos: auxílio alimentação, creche, saúde, gratificações, etc. (Lei Complementar n. 967/2018). Um deputado estadual custa mais de R$ 112 mil por mês (remuneração do deputado: R$ 25 mil; 40 assessores: cerca de R$ 50 mil e ainda tem o auxílio-moradia no valor de R$ 5 mil, sem contar despesas com alimentação, passagens, material gráfico, transporte e combustível, para as quais cada deputado tem à disposição mais de R$ 33 mil por mês). Somado a isso, tem um “mimo” que cada deputado ganha ao entrar e ao sair da Casa de Leis no valor de R$ 25mil, que é chamado de ajuda de custo. Tudo isso sem falar nos demais gastos com as atividades administrativas ordinárias (setores de licitação/contratos, pessoal, segurança, comissões, água, luz, telefone, diárias e passagens). É claro que, dentre os parlamentares, há honrosas exceções que utilizam racionalmente essas benesses, a exemplo do auxílio-moradia que não é destinado para uso pessoal, mas convertido em ações sociais. Enfim, o custo mensal da fatura com nossos parlamentares é estimado em 18 milhões.
Enquanto isso, o salário de milhares de pais de família, que ajudam a bancar toda essa estrutura de benefícios, é de R$ 954.
Pois é, cidadão-eleitor, não estou aqui a culpar ninguém. Não podemos deixar de evidenciar que o Estado de Rondônia, nos últimos anos, já dá sinais de avanço em relação a ações de eficiência administrativa. A começar com a organização e disponibilização das informações de receitas e despesas de forma pública na internet, através do portal da transparência. Também há outros feitos, como o caso da reestruturação da carreira da polícia militar, adoção do Termo Circunstanciado Operacional e do Sistema Eletrônico de Informações (SEI), aparelhamento tecnológico das polícias, instituição do documento digital da CNH e CRV, que geram economia para as finanças públicas, bem como proporcionam agilidade na prestação dos serviços. Parabéns aos gestores que capitanearam esses feitos! Mas ainda podemos ir mais longe com efeito direto na vida do povo sofrido das ruas!
Quanto ao grande volume de servidores disponíveis, por certo que temos órgãos que precisam de bastante gente para dar conta das várias demandas. Por outro lado, há vários com falta de pessoal, a exemplo da polícia civil com milhares de inquéritos empilhados com crimes não esclarecidos, as ruas sem o adequado policiamento, sem falar nos hospitais com poucos profissionais e com atendimento desumano.
Enquanto isso, há gabinetes “amontoados” de servidores que, pela quantidade de nomeações, não cabem nas salas disponíveis, se vierem todos de uma só vez trabalhar. É mais ou menos assim: uma pessoa recepciona, outro abre a porta, outro anuncia a chegada do visitante, outro oferece o café, outro serve o café, outro faz a segurança, outro coordena a reunião, outro dirige o carro do secretário, e por aí vai. Sem falar que, em várias reuniões de trabalho, há um banquete regado por um “coffe-break” com bolos, tortas e bebidas variadas, tudo de primeira linha, para o qual se contrata uma empresa com alto custo. Aí vem a reflexão: os servidores públicos, que já são remunerados com vencimento e auxílio alimentação para participarem das tais reuniões, precisam ser agraciados com mais essa fartura de privilégios? Não seria melhor converter esses excessos de "mimos" em pão na mesa de quem precisa ou qualidade no atendimento nos hospitais ou delegacias ou melhores estradas?
Vejamos um paradoxo: a Mesa Diretora da Assembleia Legislativa, integrada por 7 Deputados Estaduais, representantes do povo, tem à sua disposição 33 Policias/Bombeiros Militares do Estado, que são retirados das ruas, ficando exclusivamente para segurança dos Deputados, ganhando o salário normal acrescido de gratificação (R$1.560 e R$3.180). Por outro lado, dias atrás este subscritor viu um Juiz Federal durante o horário do trabalho dirigindo seu próprio veículo sem o acompanhamento de qualquer segurança. Vale dizer que, diariamente, este magistrado condena bandidos de alta periculosidade, inclusive esta mesma autoridade, tempos atrás, sofreu graves ameaças. Eis a pergunta: quem está exposto a maior risco um deputado, que é representante do povo, ou um juiz, que é aplicador da justiça e responsável pela resolução de conflitos? Reflitamos, pois!
Ora, não estou aqui a dizer que o agente público tem que trabalhar de forma gratuita ou sem o mínimo de estrutura de apoio operacional. O inadmissível são as regalias desnecessárias. Um exemplo a ser seguido é o do Prefeito de Colatina/ES, Senhor Sérgio Meneguelli. Se é excesso não sei, mas que está dando um banho de respeito com o povo e eficiência administrativa, sendo aplaudido pela grande massa de todos os cantos do Brasil e até exterior, disso não tenho dúvida.
É preciso um olhar sistêmico e desapegado da ideia de que a máquina pública é para ser “sugada”. Deve ser levado em consideração o princípio constitucional da eficiência, de observância obrigatória em todos os órgãos da Administração Pública. Ainda é dever de todos os agentes públicos promover um outro princípio imprescindível nos atos da Administração, qual seja, o da supremacia do interesse público sobre o privado. É possível fazer mais com menos, sempre como foco no resultado, que é o interesse da coletividade.
Devemos, urgentemente, “cair na real” e compreender que o serviço público não é serviço privado, pois neste o dono do negócio tem a liberdade de fazer o que ele quiser, vez que a coisa é particular. Já com a coisa pública é necessário ter prudência, pois o dono não é uma pessoa ou um grupo, mas toda a sociedade, que clama por investimento naquilo que é prioridade.
Até mesmo numa empresa privada o dono não esbanja dinheiro, pois sabe que é preciso ter responsabilidade para o atingimento de bons resultados. E porque no serviço público não é assim?
Portanto, nesse pós-eleição e novo ano, é possível notar um ar de esperança com a prática de ações mais direcionadas para o bem do povo. Podemos sim ter uma saúde, educação e segurança de primeiro mundo. É preciso se afastar do velho jeito de administrar com um “faz de conta”, com a ideia de que o povo fica contente com pouca coisa, que o povo está em segundo plano. Basta ter coragem e gestão, com o corte do que não é prioridade! Quem sabe o racional aproveitamento de toda a força de trabalho existente ou a redução de cargos em comissão com a valorização dos servidores públicos concursados com perfil técnico, sejam boas alternativas. Tenho certeza que o sucesso é garantido, senhor governador e deputados eleitos. O povo não aguenta mais o tal do "mais do mesmo". Fica a dica aos novos gestores que estarão à frente do nosso Estado neste novo ano que se inicia.
* Edirlei Souza - rondoniense, professor, servidor público federal, graduado em Direito, pós-graduado em Direito Eleitoral e Processo Eleitoral e pós-graduado em Comunicação Pública.
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