Rondônia, 22 de novembro de 2024
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Sobre as pessoas e as instituições

Temos acompanhado o acontecimento de grandes tragédias no Brasil nesse início de ano. Tragédias que poderiam ser evitadas se as instituições funcionassem corretamente. Ouvimos constantemente frases como: “se a empresa X tivesse tomado as medidas corretas isso poderia ter sido evitado”; “se o clube Y tivesse criado condições melhores de alojamento isso não teria acontecido”; “se os órgãos reguladores fiscalizassem corretamente...” e seguindo nesse discurso corre-se o risco de criar entidades abstratas e desresponsabilizar quem, de fato, poderia ter feito algo.

Não é a intenção aqui buscar por culpados. Ao contrário, pretende-se a reflexão sobre o que cada um de nós temos feito no nosso dia a dia. Reconhecer que as instituições são formadas por pessoas, que cada pessoa participa das decisões e posturas dos grupos, e que essas pessoas somos nós.

O sociólogo francês Philippe Zarifian, em um de seus trabalhos sobre competência, pontua que a competência é a soma da iniciativa do indivíduo e do assumir de responsabilidade. E neste último ponto temos uma questão importante, e frequentemente evitada, a ser discutida.
Zarifian explica que a responsabilidade pode ter várias interpretações. A primeira é a ideia de que assumir uma responsabilidade é responder por algo, geralmente que não foi feito ou que deveria ter sido feito, apoiada em um viés negativo. Essa é uma crença dominante na nossa sociedade, como se a responsabilidade fosse um peso, quase uma punição.

Este autor pontua também que em toda atividade profissional há um campo de responsabilidade e que assumir uma responsabilidade profissional é manifestar preocupação com os outros, pois levar adiante a tomada de iniciativa e dirigi-la inclui uma transformação que dá direito ao destinatário de julgá-la. Preocupar-se com essa transformação é responsabilizar-se por sua ação.

Na cultura do “jeitinho brasileiro” é comum o “deixa ai que depois eu vejo”, “dá um jeito nisso aqui pra mim” e o “isso não é minha responsabilidade”. São essas as bases da desonestidade, da negligência e da corrupção. Esse tipo de pensamento e comportamento é utilizado para desresponsabilizar a si mesmo, passar a responsabilidade para o outro.

Isso gera uma cadeia de acontecimentos que começam da base mais micro de qualquer ambiente, até atingir a coletividade e, em certos casos, culminam em grandes tragédias. É muito fácil se compadecer diante da TV, indignar-se e questionar as instituições, prestar solidariedade e aclamar heróis após uma tragédia distante. Parece difícil, porém, acordar na manhã seguinte e agir com responsabilidade e cuidado no próprio dia a dia.

Olhe ao seu redor, para sua casa, para o seu trabalho, não importa a sua condição financeira, sua colocação no mercado. Se você olha para o pneu cheio de água e pensa “depois vejo isso” e não tem a iniciativa de retirar a água e proteger o pneu da chuva, tem responsabilidade pelo surto de dengue da cidade. O mesmo vale para as atividades profissionais, considerando que todas devem seguir padrões éticos e procedimentos de segurança.

A visão sobre responsabilidade pode e deve ser transformada em positiva e ativa, como sugere Zarifian, cada um deve entender a responsabilidade como uma liberdade de ação e que responder por essa ação é assumir o alcance, os efeitos e as consequências dessa iniciativa. Você é a sua cidade, você é a instituição em que trabalha, você é o principal ator e regulador da sociedade em que vive.

*Juliana Maria de Oliveira – Psicóloga CRP 20/04976. Formada pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Especialista em Gestão Organizacional e de Pessoas pela Universidade Federal de São Carlos - UFSCar. Atende em Porto Velho-RO.


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