Técnica de edição de genoma promete revolucionar a ciência
CRISPR, do inglês Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats, é uma tecnologia de edição de genoma que permite identificar genes de interesse, no DNA de qualquer espécie, e modificá-lo de acordo com as necessidades da pesquisa, sem a inclusão de genes de outras espécies.
Segundo o pesquisador Alexandre Nepomuceno, da Embrapa Soja (Londrina, PR), um dos pioneiros na utilização do CRISPR na Empresa, essa tecnologia é relativamente nova – começou a ser utilizada na agricultura em 2014.
"Já existiam ferramentas de edição de genoma, mas eram muito complexas. O CRISPR é mais acessível. Qualquer laboratório com treinamento adequado tem a capacidade de usar essa ferramenta para editar um genoma", explica o pesquisador.
De acordo com ele, o CRISPR funciona como um corretor ortográfico. "Por exemplo: no caso de uma doença genética, fruto de uma mutação nas bases nitrogenadas da cadeia de DNA, é possível corrigir isso por meio dessa ferramenta".
Nepomuceno explica que o sistema CRISPR é composto por substâncias químicas: uma molécula de RNA e uma proteína. A combinação dessas duas substâncias consegue localizar a sequência de DNA que se quer modificar dentro do núcleo da célula e a modifica.
A técnica foi descoberta estudando o sistema imunológico de bactérias, que quando são atacadas por um vírus guardam pedaços da informação do DNA desse organismo que ela destruiu. Assim, toda vez que a bactéria é invadida pelo mesmo vírus, ela o reconhece rapidamente.
"Então os cientistas pensaram: e se eu mudar essa informação do patógeno, do vírus, e colocar no lugar a informação de qualquer sequência de DNA que eu quiser identificar? Foi assim que eles conseguiram bolar esse sistema de edição gênica", comenta Nepomuceno.
Aplicações práticas - O pesquisador ressalta que por meio dessa técnica é possível corrigir e criar novas situações. Por exemplo: a soja resistente ao glifosato foi criada por meio da introdução do gene inteiro de uma bactéria, que tem uma mutação capaz de impedir a atuação do herbicida na planta.
"Usando a tecnologia CRISPR, os cientistas mudaram no DNA de plantas como a canola e o arroz neste mesmo gene e fizeram uma alteração para deixá-lo igual ao da bactéria, só naquele local de ação do herbicida. Não precisou inserir o gene inteiro da bactéria. Ou seja: não é um transgênico", diz Nepomuceno.
Outro exemplo prático e recente, segundo ele, é um milho que será lançado no EUA para fabricação de papel e utilização na indústria alimentícia. A semente do milho tem dois tipos de amido: a amilose (25%) e a amilopectina (75%), mas para utilização nessa indústria, quanto menos amilose, melhor.
"Então eles fizeram um milho modificado com a técnica CRISPR, desligando o gene que produz a amilose. Esse milho tem 100% de amilopectina e já foi aprovado como não transgênico nos EUA. Mas é um milho que foi modificado geneticamente e é de grande interesse para a indústria", explica.
Para Nepomuceno, esses exemplos mostram que as tecnologias de edição de genoma aparecem como uma ferramenta extremamente poderosa na medicina, na indústria e principalmente na agricultura para agregar valor e tentar resolver problemas do agronegócio.
"Elas já estão revolucionando pela facilidade de uso e pela precisão dessas modificações genéticas, além de fugir um pouco da polêmica dos transgênicos", afirma. Isso porque a tecnologia CRISPR permite reforçar ou inibir determinadas característica de um organismo, sem a necessidade de incluir genes de outras espécies. "Uma mudança que levaria centenas de anos na natureza, por meio de mutações naturais, pode ser feita com uma mutação induzida usando essas tecnologias."
Medicina - O pesquisador ressalta que na medicina o potencial para essa tecnologia também é muito grande. Na terapia gênica, por exemplo, seria possível tratar uma pessoa que nasce com uma doença genética, provocada por um erro na sequência de DNA de um gene específico.
Nepomuceno cita a categoria de hemofílicos que apresenta um problema de coagulação no fator nove. Eles não produzem esse fator de coagulação e, por isso, sangram até morrer caso se machuquem.
"Existem pesquisadores tentando resolver esse problema, corrigindo a sequência de DNA que gera esse problema. Claro que isso não é um processo simples: como é que você corrige todas as células de um organismo? Mas a ciência está indo nessa direção e em tese é possível."
Primeiros passos - Estratégias de utilização da tecnologia CRISPR foram discutidas, na terça-feira (14/06), por pesquisadores da Embrapa, durante uma oficina promovida pela Secretaria de Inteligência e Macroestratégia (SIM), em Brasília (DF).
No Brasil ainda são poucos grupos trabalhando com a tecnologia CRISPR. Na Embrapa, por enquanto apenas cinco Unidades e o Labex EUA estão começando a utilizá-la: Embrapa Soja, Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Brasília, DF), Embrapa Gado de Leite (Juiz de Fora, MG), Embrapa Milho e Sorgo (Sete Lagoas, MG) e Embrapa Agroenergia (Brasília, DF).
"Por isso, é extremamente estratégico para a Embrapa e o Brasil aumentar a formação de massa crítica nessa área", ressalta Nepomuceno. Segundo ele, a tecnologia CRISPR está disponível para qualquer pesquisador da Embrapa que tiver interesse. "Basta entrar em contato que nós daremos o apoio necessário para utilizar essa ferramenta", afirma o pesquisador, lembrando que outra vantagem do CRISPRS é que se trata de uma tecnologia relativamente barata em relação às outras técnicas de edição de genoma.
Os especialistas da Embrapa que já vêm trabalhando com edição de genes irão agora construir uma estratégia de ação para os próximos anos. "As técnicas são novas, mas estão evoluindo rapidamente. Portanto, há urgência em definir uma estratégia para a Empresa para apoiar as ações de pesquisa na área", destaca o chefe da SIM, Elísio Contini.
O presidente da Embrapa, Maurício Lopes, destacou que a possibilidade de fazer a edição de genoma com uma precisão tão alta e a um custo relativamente baixo representa uma nova revolução para a ciência. "É impressionante como um conjunto de conhecimentos pode causar um impacto tão grande em áreas tão diversas", destacou.
Na opinião de Maurício Lopes, o uso da tecnologia CRISPR permitirá olhar a biodiversidade num sentido mais amplo. "Temos um mundo a ser explorado e a Embrapa possui o ingrediente principal, que é gente bem treinada e capacitada para desenvolver novos estudos nessa área e gerar resultados", assinalou.
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