Rondônia, 23 de novembro de 2024
Polícia

JUSTIÇA REVOGA PREVENTIVA DE PM PRESO NA OPERAÇÃO NACIO; VEJA NA ÍNTEGRA DECISÃO QUE DECRETOU PRISÕES

Menos de um mês após a prisão de policiais militares durante a Operação NaCIO, a Justiça determinou a soltura de um deles na última quarta-feira. A decisão é do juiz Carlos Augusto Teles de Negreiros, da 1ª Vara da Auditoria Militar. O Ministério Público não conseguiu provas contra Tony Carlos Nunes Pereira e houve a revogação da prisão preventiva. Tony e outros sete colegas foram presos no dia 17 de setembro, quando a Polícia Federal cumpriu os mandados em Porto Velho.

As investigações envolvem os policiais militares Pablo Mendonça de Oliveira, David Saraiva da Silva, Jorge Xavier da Rocha,  Acácio Leiva Policena,  Ataíde José dos Santos,  Dário Souza Silva e  Robson Batista Galindo. O RONDONIAGORA obteve acesso exclusivo aos mandados e a decisão das prisões preventivas, solicitadas por um delegado da PF. As prisões foram decretadas pelo mesmo juiz. Na última semana as denúncias foram recebidas pelo Poder Judiciário e agora os acusados tem 10 dias de prazo para apresentarem defesa.

Nas justificativas apresentadas para a decretação das preventivas, o juiz destaca escutas telefônicas e ambientais, além de outros elementos de prova. “Extrai-se da representação o envolvimento dos policiais militares com vários crimes, conforme mencionado acima. Os pressupostos e fundamentos da prisão preventiva estão previstos nos artigos 220 c/c 254 “a” e “b, 255 “a” usque “e” do Código de Rito Militar...Na representação a autoridade policial conseguiu trazer elementos convincentes acerca da existência dos fatos delituosos e de indícios de autoria, em especial por meio da colação de vários trechos de conversas obtidos na interceptação telefônica e/ou escuta ambiental....Na representação restou evidente por intermédio das escutas realizadas o envolvimento dos representados nas condutas delituosas. A gravidade dos delitos atribuídos a eles reclama a segregação cautelar para a garantia da ordem pública e manutenção da disciplina militar.”, disse.

Com exceção de Tony Carlos todos os outros acusados permanecem sob custódia da própria PM. A situação de todos é complicada. No último dia 26, ao negar o pedido de revogação de prisão feito pela defesa de Pablo Mendonça de Oliveira, o juiz destacou que o que a sociedade esperava de um servidor público militar era o contrário do que se apurou. “Trata-se de policial militar que deveria contribuir com a segurança pública, no combate à criminalidade, mas na verdade passou a se corromper e a se entregar à prática daquilo que seu mister é dado a combater, ou seja, à ilicitude e improbidade, adotando conduta incompatível com a carreira militar (ORDEM PÚBLICA), que tem como um dos pilares a hierarquia e DISCIPLINA MILITAR. A farda da gloriosa Polícia Militar de Rondônia existe e é respeitada pelo combate à marginalidade penal e não para se unir a ela. Comportamento como o do requerente fere de morte a disciplina militar. A decretação da prisão preventiva partiu de fatos concretos e motivados para ampará-la. A sociedade clama pelo banimento da corrupção ou improbidade no serviço público e com mais rigor nas polícias militares. ”, considerou. VEJA A SEGUIR A ÍNTEGRA DA DECISÃO QUE MANDOU OS POLICIAIS PARA A PRISÃO:



Com a representação, veio em separado, cópia integral do IPL originário e do procedimento na vara de Delitos de Tóxicos (cautelar).
O Delegado de Polícia Federal Flori Cordeiro de Miranda Júnior, formulou pedido de representação pela prisão preventiva em desfavor dos policiais militares Pablo Mendonça de Oliveira, David Saraiva da Silva, Jorge Xavier da Rocha, Acácio Leiva Policena, Ataíde José dos Santos, Dário Souza Silva, Robson Batista Galindo e Tony Carlos Nunes, além do civil A.N. da S., alegando, em suma, que deram início a investigações junto à Vara de Delitos de Tóxicos de Porto Velho tendo em vista que policiais militares poderiam estar cometendo crimes previstos em legislação especial que reprime o tráfico de entorpecentes, e embora alguns envolvidos já tenham inclusive tido sua prisão solicitada, foi constatado que outros policiais praticaram crimes afetos à jurisdição militar, em especial crimes de concussão (art. 305 do CPM), apropriação indébita (art. 248 do CPM), associação criminosa (art. 288 do CPB) e corrupção ativa e passiva (arts. 308 e 309 do CPM). Requereu, além da decretação da prisão preventiva dos policiais mencionados, a expedição de mandado de busca e apreensão para todos os envolvidos, e expedição de mandado de condução coercitiva em face de V. S. A. (fls. 02/42).

Com a representação, veio em separado, cópia integral do IPL originário e do procedimento na vara de Delitos de Tóxicos (cautelar).

O Ministério Público, na pessoa do promotor de justiça, Dr. Alan Castiel Barbosa, consignou inicialmente a competência da Justiça Militar, uma vez que a conduta dos policiais militares se amolda ao disposto no art. 9º do CPM. Emitiu parecer favorável e pugnou pelo deferimento da decretação da prisão preventiva dos representados, bem como expedição do mandado de busca e apreensão para todos os envolvidos. Com relação a condução coercitiva, pugnou pelo seu indeferimento por não encontrar previsão legal e estar em discordância com o disposto no art. 218 do CPP (fls. 46/54). É o relato.

Decido.

1. Competência.

O pedido de representação traz elementos suficientes para, nesta fase, se firmar a competência da Justiça Militar, uma vez que a conduta adotada pelos policiais militares se enquadra nas previsões contidas no art. 9º do CPM, salvo aquela imputada ao civil, como se verá mais adiante. Noticia-se conduta de policiais militares, ora fardados, ora não, inclusive com o uso de viatura oficial. Verificando os documentos acostados há indícios da participação dos representados na prática de diversos crimes, dentre eles crimes de concussão (art. 305 do CPM), apropriação indébita (art. 248 do CPM), corrupção ativa e passiva (arts. 308 e 309 do CPM), e ainda, embora sem previsão no CPM, o crime de associação criminosa (art. 288 do CPB), pelo qual poderão ser posteriormente denunciados na vara genérica. Com relação ao civil, ouso divergir do M.P., quanto ao imputação de crime militar praticado por este e articulado na presentação, uma vez que todos os crimes mencionados são impróprios, possuindo previsão no CPM e CPB. Responderão os militares na auditoria, pelos crimes militares, e o civil perante uma das varas criminais.

Observe-se. Jorge César de Assis, em Comentários ao Código Penal Militar, citando Clóvis Beviláqua, menciona os grupos de delitos militares, dentre eles os crimes essencialmente militares (crimes próprios), crimes militares por compreensão normal da função militar (crimes impróprios) e, ainda, os crimes acidentalmente militares (que são praticados por civis). Mais adiante complementa: “Quando o civil comete crime militar, levando-se em conta, sempre o critério ex vi legis do nosso Código Penal Castrense, entendemos que tal delito é Acidentalmente Militar, seja contra as instituições militares, à luz do serviço militar da Insubmissão (art. 183), de mão única, que sendo militar só pode ser praticado por civil” (ASSIS, Jorge Cesar de. Comentários ao Código Penal Militar “ Editora Juruá “ 6ª Edição revista e atualizada “ Páginas 48 e 49)Ora, embora exista conexão ou continência entre a conduta dos policiais militares com a do civil, o art. 102, alínea “a” do CPPM preceitua que “a conexão e a continência determinarão a unidade do processo, salvo: a) no concurso entre a jurisdição militar e a comum”. No mesmo sentido súmula 90 do STJ, segundo a qual: “compete à Justiça Estadual Militar processar e julgar o policial militar pela prática do crime militar e à Comum pela prática do crime comum simultâneo àquele.” Não bastasse, o inciso III, alínea “a” só se aplica à Justiça Militar da União, jamais à Estadual.

Neste sentido a doutrina:” Seguindo entendimento doutrinário e jurisprudencial, contrariado algumas vezes equivocadamente, o mandamento constitucional, expresso no artigo 125, § 4º, não deixa dúvida quanto a vedação da Justiça Militar estadual de processar e julgar o civil” (Lobão, Célio - Comentário ao Código Penal Militar, ed., ijen/forense 2011, vol 1, pág 55)”Já destacamos o conceito de militar da reserva e reformado constante do artigo 3º do Estatuto dos Militares (Lei n. 6.880/80) e devemos lembra ainda que se civil não podem ser processados e julgados perante a Justiça Militar Estadual, portanto esse inciso III somente se aplica aos processos em cursos juntos a Justiça Militar da União (Cruz, Ione de Souza e Miguel, Cláudio Amin. Elementos de Direito Penal Militar, parte geral, 2ª ed., editora Lumen Juris, RJ 2008, pág 47). E Jurisprudência:”A jurisprudência penal dos órgãos integrantes da estrutura institucional da Justiça Militar dos Estados Membros não se estende, constitucionalmente, aos integrantes das Forças Armadas nem abrange os civis (RTJ 158/513-514, Rel. Min., Celso de Melo), ainda que a todos eles haja sido imputadas a suposta prática de delitos militares contra a própria Polícia Militar do Estado ou os agentes que a compõe. Precedente..” (STF, HC 83.003, Rel. Min. Celso de Melo) Como visto a Justiça Estadual Militar não tem competência para processar e julgar o crime praticado por civil.

2. Decretação da prisão preventiva dos militares.

Extrai-se da representação o envolvimento dos policiais militares com vários crimes, conforme mencionado acima. Os pressupostos e fundamentos da prisão preventiva estão previstos nos artigos 220 c/c 254 “a” e “b, 255 “a” usque “e” do Código de Rito Militar.Fumaça do bom direito (existência do crime e indícios de autoria). Na representação a autoridade policial conseguiu trazer elementos convincentes acerca da existência dos fatos delituosos e de indícios de autoria, em especial por meio da colação de vários trechos de conversas obtidos na interceptação telefônica e/ou escuta ambiental. Fatos graves!Periculun in mora (fundamentos).Na representação restou evidente por intermédio das escutas realizadas o envolvimento dos representados nas condutas delituosas. A gravidade dos delitos atribuídos a eles reclama a segregação cautelar para a garantia da ordem pública e manutenção da disciplina militar.

Sobre a prisão preventiva assim manifestou-se o Ministro José Cândido, do Superior Tribunal de Justiça, no RHC nº 347 - RJ : “É necessário que se reconheça que a prisão cautelar é medida excepcional, e por muitos processualistas, como é o caso de Faustin Hélie, entendida como “injustiça necessária”. Para outros é considerada uma “fatal necessidade”. Para o processualista Flamand, citado por Basileu Garcia, nos seus Comentários ao Código de Processo Penal ( Forense, vol. III, pág. 141 ) “a prisão preventiva e um mal necessário”. É uma dessas dolorosas necessidades sociais, perante as quais somos forçados a nos inclinar” ( in RSTJ, 8/170 ). Como ensina Mirabete: contenta-se a lei, agora, com simples indícios, elementos probatórios menos robustos que os necessários para a primeira exigência (materialidade). Não é necessário que sejam indícios concludentes e unívocos, como se exige para a condenação; não é preciso que gerem certeza da autoria. Neste tema, a suficiência dos indícios de autoria é verificação confiada ao pudente arbítrio do magistrado. ( Processo Penal, 2ª Ed. - S. Paulo: Atlas, 1992, pág. 370). Como já decidiu o STF a preventiva deve ser regulada pela sensibilidade do juiz à reação do meio ambiente à ação criminosa. Neste Sentido RTJ 124/1033. Garantia da ordem pública e manutenção da disciplina militar.

Neste contexto vislumbra-se a necessidade do Estado-Juiz intervir para garantir a ordem pública e a disciplina militar (art. 255, CPPM), mantendo-se afastados das ruas policiais militares, até aqui, tido como corruptos e afetos à pratica de crimes ligados a improbidade, conduta incompatível com a carreira militar. O policial é preparado para combater a criminalidade e não se unir aos criminosos, valendo-se da farda para auferir lucro ilícito. É um péssimo exemplo a disciplina militar.

Trata-se de conduta grave, ademais, as provas colhidas no caderno apuratório revelam a necessidade do Estado-Juiz intervir para garantir a ordem pública e manter a disciplina militar. Como já decidiu o STF a preventiva deve ser regulada pela sensibilidade do juiz à reação do meio ambiente à ação criminosa. Neste Sentido RTJ 124/1033. Estando satisfeito os pressupostos e fundamentos, vê-se que alguns dos crimes, em tese, imputados aos policiais militares (concussão “ art. 305 do CPM e corrupção passiva e ativa “ arts. 308 e 309 do CPM) cominam penas de reclusão de até 8 anos. Ora, se condenados forem, nos termos da legislação castrense, o regime poderá ser outro que não aquele que lhe permita cumprir a reprimenda em liberdade. Isso, é claro, no campo das hipóteses e suposições.Registre-se que presentes os pressupostos e fundamentos da preventiva, como in casu, incabível a liberdade provisória e o caso não comporta menagem (art. 270 do CPPM), pois os crimes preveem penas superiores a 2 anos, portanto, entendo conveniente a prisão preventiva por dois fundamentos.
Em suma, estou plenamente convencido da necessidade da segregação cautelar dos policiais militares.

3. Da Busca domiciliar dos militares.

O Código de Ritos Militar preceitua que proceder-se-á a busca, quando fundadas razões a autorizem, para, dentre outras hipóteses (art. 172): a) pender criminosos; b) apreender coisas achadas e obtidas por meios criminosos; d) armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinado a fim delituoso; e) descobrir objetos necessários à prova da infração; h) colher qualquer elemento de convicção.
A representação visa apreender armas, munições, produtos ilícitos e outros elementos que possam ter sido utilizada na prática de crimes, ou que sejam produtos de crimes. Denota-se que os presentados são policiais militares envolvidos numa trama criminosa, valendo-se da farda, para enriquecimento ilícito. Neste compasso entendo que a medida é proporcional ao fim desejado e deve ser deferida, visando a apreende qualquer elemento de prova dos crimes de Pablo Mendonça de Oliveira, David Saraiva da Silva, Jorge Xavier da Rocha, Acácio Leiva Policena, Ataíde José dos Santos, Dário Souza Silva, Robson Batista Galindo e Tony Carlos Nunes, sem prejuízo de outras infrações (art. 172, letras “a”, “b”, “d”, “e” e “h”, CPPM).

O Código de Ritos faculta ao magistrado decretar a busca domiciliar em várias hipóteses, todas visando buscar elementos para elucidação da autoria e materialidade delitiva sempre, é claro, sem descuidar do direito à privacidade, da dignidade da pessoal humana e interesse do Estado em combater a criminalidade. Ressalto que a busca domiciliar deverá ser executada de dia, salvo se o morador consentir que se realize à noite, sem qualquer excesso e dentro dos procedimentos elencados pelos art. 175, 178, 179 todos do CPPM. Ao reconhecer a incompetência da Justiça Militar Estadual para os crimes praticados pelo civil tal pedido será indeferido.
4. Da condução coercitiva

A respeito da condução coercitiva razão assiste ao M.P., pois a pessoa indicada sequer foi notificada a comparecer na delegacia, ou se foi não consta registro. Cediço que só se admite a condução e outras sanções caso, uma vez intimada, a pessoal deixe de comparecer sem justo motivo (art. 347, §§ 1º e 2º, CPPM). Somente após a regular notificação para comparecimento e a negativa da pessoal é que se pode contemplar a condução coercitiva. Pedido será indeferido.
ISTO POSTO, com suporte na melhor doutrina e jurisprudência acerca dos temas expostos na representação,
DECIDO:

A) indeferir o pedido de condução coercitiva da pessoa indicada na representação;
B) indeferir e o pedido de prisão preventiva e busca domiciliar do civil, igualmente indicado na representação, por reconhecer a incompetência da Justiça Militar Estadual para processar e julgar esse cidadão, nos termos da fundamentação.;

C) DECRETAR, com suporte nos artigos 220 c/c 254 e 255, “a” e “e”, todos do CPPM, a prisão preventiva de Pablo Mendonça de Oliveira, David Saraiva da Silva, Jorge Xavier da Rocha, Acácio Leiva Policena, Ataíde José dos Santos, Dário Souza Silva, Robson Batista Galindo e Tony Carlos Nunes, visando garantir a ordem pública e a manutenção da disciplina militar, que restaram atingidas com a liberdade dos representados. A prisão dos militares deve ser acompanhada por oficial, nos termos do artigo 223, CPPM, submetendo os presos ao exame de corpo de delito e, após a adoção das medidas cabíveis, deverão ser encaminhados ao Complexo de Correição da PMRO;

D) DEFERIR a busca domiciliar referente aos representados Pablo Mendonça de Oliveira, David Saraiva da Silva, Jorge Xavier da Rocha, Acácio Leiva Policena, Ataíde José dos Santos, Dário Souza Silva, Robson Batista Galindo e Tony Carlos Nunes, a ser realizada nos endereços indicados na representação, visando a apreender qualquer elemento de prova da infração prevista no CPM, artigos 248 (apropriação indébita), 305 (concussão), 308 (corrupção passiva), 309 (corrupção ativa), sem prejuízo de outras, com suporte no artigo 176 c/ 171 e 171, letras a, b, d, e h, todos do CPPM, observando-se os dispostos nos artigos 175, 178 e 179 do mesmo diploma legal.
A busca só poderá ser realizada de dia, salvo expresso consentimento do morador. Antes de penetrar na casa os executores lerão o mandado, intimando o morador para abrir a porta, declinando em que consiste a busca. No mais, observem-se as regras contidas nos art.175 CPPM. Deve a autoridade encarregada das diligências fazer valer, se necessário for, as prerrogativas contidas no art. 179, CPPM. A diligência deve ser acompanhada de testemunhas. Finda a diligência, os executores lavrarão auto circunstanciado, assinando-o com duas testemunhas presenciais, encaminhando cópia ao Juízo. Efetivada o cumprimento das medidas dê-se ciente aos interessados (MP, representado) e 48 horas após lance a decisão no sistema. Expeça-se mandado de prisão inserindo a incidência penal e os mandados de busca deve constar os endereços e prazo de validade de 30 dias.
Porto Velho - RO ,  sexta-feira, 19 de setembro de 2014 . Carlos Augusto Teles de Negreiros   Juiz de Direito

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