Rondônia, 22 de novembro de 2024
Política

APÓS SER SOLTO, EMPRESÁRIO ENVOLVIDO EM CORRUPÇÃO QUER MANTER CONTRATO DE EMPRESA COM O GOVERNO

Duas semanas após ser solto por colaborar com as investigações, o empresário José Miguel Saud Morheb, dono da empresa Maq Service, teve negado a pretensão de manter contrato com o Governo. Ele e a empresa foram envolvidos no maior escândalo de corrupção nos últimos tempos em Rondônia e que veio a tona com a Operação Termópilas. Miguel foi denunciado e preso, mas acabou solto no dia 8 de dezembro, agora, impetrou com Agravo de Instrumento com objetivo de manter o contrato com o Governo sob a alegação de que houve ilegalidade na rescisão determinada pelo Estado e que não teve direito a defesa.

Os argumentos não convencera o desembargador Walter Waltenberg Silva Júnior, plantonista da Justiça de Rondônia. “No tocante à alegação de que a Administração não pode exercer o poder rescisório sem observância do devido processo legal e do contraditório, é necessário reiterar, que o particular pode até buscar a comprovação de que não deu causa à rescisão do contrato, para fins de recomposição de eventuais prejuízos que possa ter suportado. É inviável, no entanto, exigir-se o cumprimento do contrato já rescindido, ainda que unilateralmente, pelo Poder Público; ou seja, não tem a parte, direito à continuidade à continuidade do serviço, ainda que não lhe tenha sido observado o contraditório, cuja mácula não lhe confere a proteção pela via mandamental na continuidade da execução contratual.”. CONFIRA ÍNTEGRA DA DECISÃO:



Narra a empresa agravante que possui contratos de prestação de serviços com o Governo Estadual bem com a autarquia agravada.

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Maq-Service Construções e Serviços Ltda em face do Departamento Estadual de Trânsito de Rondônia – DETRAN/RO e do Diretor-Geral do DETRAN/RO, Airton Pedro Gurgacz.

Narra a empresa agravante que possui contratos de prestação de serviços com o Governo Estadual bem com a autarquia agravada.

Aduz que, em razão do recente escândalo político estadual, o Exmo. Governador emitiu o Decreto n. 16.344, de 22 de novembro de 2011, no qual rescinde os contratos de várias empresas e suspende o pagamento de outras, todas com envolvimento no dito escândalo.

Afirma a empresa recorrente que, entretanto, está na lista do citado decreto como das empresas com o pagamento suspenso, porém, com continuidade do serviço.

Contudo, o Ilmo. Diretor do DETRAN/RO, notificou a empresa ora postulante de que teria tido como rescindido seus contratos com aquela entidade, o que, em tese, não seria correto, pois, a teor do decreto, somente seria cabível a suspensão dos pagamentos, evidenciando nítida interpretação equivocada do ato editado pelo Governador do Estado.

Neste contexto, impetrou mandado de segurança com o objetivo de obter a continuidade da prestação de serviço de modo a impedir a rescisão contratual, tendo pugnado por liminar a qual foi indeferida pelo magistrado de primeiro grau.

Inconformada, agrava ao argumento de que a decisão administrativa viola o princípio de devido processo legal, já que não houve qualquer oportunização à discussão da rescisão, bem como o motivo do ato (rescisão) é nulo, porquanto teria partido de interpretação equivocada do agente público. Pugna por efeito suspensivo ativo.

É o sucinto, mas, necessário relatório.

Decido.

O caso dos autos trata de irresignação de empresa que cumpria contrato com a Administração Pública e teve seu contrato rescindido unilateralmente.

Pois bem, no universo administrativo, em especial no mundo dos contratos, é cediço e notório a predominância da Administração Pública sobre os particulares.

A esse respeito, é oportuno transcrever os ensinamentos de Hely Lopes Meirelles:

"Alteração e rescisão unilaterais: o poder de alteração e rescisão unilaterais do contrato administrativo é inerente à Administração, pelo quê podem ser feitas ainda que não previstas expressamente em lei ou consignadas em cláusula contratual. Assim, nenhum particular, ao contratar com a Administração, adquire direito à imutabilidade do contrato ou à sua execução integral ou, ainda, às suas vantagens in specie, porque isto equivaleria a subordinar o interesse público ao interesse privado do contratado.

O poder de modificação unilateral do contrato administrativo constitui preceito de ordem pública, não podendo a Administração renunciar previamente à faculdade de exercê-lo, como, muito acertadamente, sustentam Jèze e Bonnard. Seu fundamento, segundo Laubadère, é a competência exclusiva das autoridades para organizar e administrar as obras e serviços públicos como verdadeiros donos. Por isso mesmo, a alteração só pode atingir as denominadas cláusulas regulamentares ou de serviço, isto é, aquelas que dispõem sobre o objeto do contrato e o modo de sua execução. Do mesmo modo, o poder de rescisão unilateral do contrato administrativo é preceito de ordem pública, decorrente do princípio da continuidade do serviço público, que à Administração compete assegurar. [...]

Resumindo: é a variação do interesse público que autoriza a alteração do contrato e até mesmo a sua extinção, nos casos extremos, em que sua execução se toma inútil ou prejudicial à comunidade, ainda que sem culpa do contratado; o direito deste é restrito à composição dos prejuízos que a alteração ou a rescisão unilateral do ajuste lhe acarretar."
(in Direito Administrativo Brasileiro, 31ª edição, atualizada por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho - São Paulo:Malheiros, 2005, pág. 214). (g.n)

A propósito cito pacífica jurisprudência a respeito do tema, cuja posição pode ser representada pelo seguinte aresto:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NA MEDIDA CAUTELAR. CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO ESPECIAL ADMITIDO NA ORIGEM. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO FUMUS BONI IURIS E DO PERICULUM IN MORA. INDEFERIMENTO DO PEDIDO LIMINAR. NEGATIVA DE SEGUIMENTO DA CAUTELAR, COM FUNDAMENTO NO ART. 34, XVIII, DO RISTJ.

1. Alegação de que houve a rescisão de contrato administrativo de concessão de uso do navio de apoio logístico "Atlântico Sul", de propriedade da Marinha do Brasil, sem observância dos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, razão pela qual se requer a concessão de liminar determinando a imediata entrega da referida embarcação, com a finalidade de se dar cumprimento ao contrato de concessão remunerada de uso.

2. A medida cautelar exige, para a sua concessão, necessariamente, a presença cumulativa dos requisitos da plausibilidade do direito invocado e do risco de dano irreparável (fumus boni iuris e periculum in mora). A ausência de qualquer dos requisitos referidos obsta a pretensão de se conferir efeito suspensivo ao recurso especial.
[...]

Ademais, por se tratar de contrato administrativo, deve-se ter em vista o predomínio da vontade da Administração sobre a dos particulares. Tem-se, assim, que o particular pode até buscar a comprovação de que não deu causa à rescisão do contrato, para fins de recomposição de eventuais prejuízos que possa ter suportado. É inviável, no entanto, exigir-se o cumprimento do contrato já rescindido, ainda que unilateralmente, pelo Poder Público. Ausência do fumus boni iuris, consubstanciado na probabilidade de êxito do recurso especial.
[...]
Agravo regimental desprovido.
(STJ – Primeira Turma - AgRg na MC 13670/RJ, relª. Minª. Denise Arruda, em 04/03/2008)

No tocante à alegação de que a Administração não pode exercer o poder rescisório sem observância do devido processo legal e do contraditório, é necessário reiterar, que o particular pode até buscar a comprovação de que não deu causa à rescisão do contrato, para fins de recomposição de eventuais prejuízos que possa ter suportado. É inviável, no entanto, exigir-se o cumprimento do contrato já rescindido, ainda que unilateralmente, pelo Poder Público; ou seja, não tem a parte, direito à continuidade à continuidade do serviço, ainda que não lhe tenha sido observado o contraditório, cuja mácula não lhe confere a proteção pela via mandamental na continuidade da execução contratual.

A propósito, confiram-se os seguintes julgados do Col. STJ acerca do tema:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. FALTA DE COMPROVAÇÃO DA SUA REALIZAÇÃO. INTERRUPÇÃO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RESCISÃO DE SUPOSTO CONTRATO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. NECESSÁRIA DILAÇÃO PROBATÓRIA.
Omissis.

5. Ad argumentandum tantum, sobreleva notar, que em face de contrato administrativo seria cabível a rescisão unilateral pela Administração, calcada no princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o privado, que norteia todo o contrato administrativo, consoante se extrai do teor dos artigos 78, XII c/c art. 79, I, da Lei 8.666/93. Nesse sentido abalizada doutrina do saudoso jurista Hely Lopes Meirelles: 'A rescisão administrativa por interesse público ou conveniência da Administração tem por fundamento a variação do interesse público, que autoriza a cessação do ajuste quando este se torne inútil ou prejudicial à coletividade. Ao efetiva a rescisão por interesse público, a Administração poderá fixar o valor da indenização cabível, verificado através de operações contábeis. O contratado não poderá opor-se à medida, mas, não concordando com o valor da indenização, deverá recorrer às vias judiciais adequadas, pleiteando unicamente a justa reparação dos danos sofridos com a antecipada extinção do contrato.' (in Direito Administrativo Brasileiro , São Paulo, Malheiros, 31ª Edição, 2005, p. 247.)
Omissis.

8. Recurso ordinário desprovido.
(RMS 20.264/RO, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 1º.3.2007) (g.n)

ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RESCISÃO. INDENIZAÇÃO.
1. Distinguem-se os contratos administrativos dos contratos de direito privado pela existência de cláusulas ditas exorbitantes, decorrentes da participação da administração na relação jurídica bilateral, que detém supremacia de poder para fixar as condições iniciais do ajuste, por meio de edital de licitação, utilizando normas de direito privado, no âmbito do direito público.

2. Os contratos administrativos regem-se não só pelas suas cláusulas, mas, também, pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes supletivamente
as normas de direito privado.

3. A Administração Pública tem a possibilidade, por meio das cláusulas chamadas exorbitantes, que são impostas pelo Poder Público, de rescindir unilateralmente o contrato.

4. O Decreto-Lei nº 2.300/86 é expresso ao determinar que a Administração Pública, mesmo nos casos de rescisão do contrato por interesse do serviço público, deve ressarcir os prejuízos comprovados, sofridos pelo contratado.
5. Recurso especial provido em parte.
(STJ - REsp 737.741/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 1º.12.2006)

Ao contrário do que verbera a recorrente, o risco de dano irreparável, ao que se extrai dos autos, parece operar em favor da parte requerida (Administração Pública).

Assim, na medida em que ausente a fumaça do direito (ausência de plausabilidade da existência do direito alegado), falta-lhe pressuposto para o manejo do agravo de instrumento.

Pelo exposto, nos termos do art. 557 do CPC, nego seguimento ao recurso.

P. R. I. C. Porto Velho - RO, 22 de dezembro de 2011. Desembargador Walter Waltenberg Silva Junior plantonista

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